Domingos Franciulli Neto, saudoso ministro do Tribunal Superior de Justiça (STJ), era um juiz exemplar, no dizer de seu colega e ex-presidente daquela Corte, Paulo Costa Leite. Uma das maiores preocupações que carregou nessa profissão, como externava a todos, era a dificuldade de comunicação entre a magistratura e a sociedade brasileira, sobretudo no que se refere à “exaustiva carga de trabalho do juiz”, como denominava a faina com as lides processuais. Ilustrava essa situação com um caso que ele próprio protagonizara logo que se iniciou como magistrado na Justiça estadual de São Paulo, na cidade de Auriflama.
Franciulli fora morar num prédio no centro daquela cidade, tendo como vizinho de parede e meia outro juiz. Ambos costumavam levar muitos processos para despachar em casa nos finais de semana e feriados, vez que não davam conta durante os dias úteis devido ao acúmulo de tarefas. Os apartamentos dos dois juízes eram dotados de u varandinhas nas quais – lembrava Franciulli com certa nostalgia – eles fumavam e se alongavam entre uma e outra sentença.
Quando os dois vizinhos davam de cara ao espairecer nas varandas, era comum e inevitável o seguinte diálogo:
– Quantas você já deu hoje, Franciulli – perguntava o vizinho.
– Eu já dei duas. E você, colega, quantas deu?
– Já dei quatro – respondia o vizinho, em tom triunfante.
Ao contar essa historieta, Franciulli concluía, sorridente, entre baforadas no inseparável cigarro:
– É dura a vida de juiz, pois quem ouvisse aquele diálogo de Auriflama ia achar que os juízes tratavam de um torneio de desempenho sexual. Mas, na verdade, estavam simplesmente falando em dar sentenças.
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